segunda-feira, 21 de abril de 2014

Para onde está a olhar?

Chama-se Ema Loja. Trabalha no Centro de Estudos sobre Deficiência da Universidade de Leeds. Acha que o problema não está nas pessoas com incapacidade, mas na sociedade, que cria contextos repletos de barreiras.
Olhou bem para a fotografia? Terá feito o que Ema Loja descreve como um olhar fixo, que transforma o outro num objecto, numa tragédia, e que, como qualquer tragédia, inspira curiosidade ou pena ou um misto de curiosidade e pena? “É muito difícil ser olhado desta forma”, diz ela. “É perturbador.”
Doutorada pela Faculdade de Psicologia e Ciências de Educação da Universidade do Porto, Ema trabalha no Centro de Estudos sobre Deficiência, na Universidade de Leeds, em Inglaterra. Não gosta de falar na sua experiência pessoal, mas admite ter partido dela para a carreira de investigação.
Aquele olhar, a que os ingleses chamam “gaze”, é uma constante — na rua, no metro, no autocarro, em qualquer lado. “Toda a gente que tem uma deficiência leva com esse olhar”, afiança a investigadora, de 36 anos. Há pessoas que se cruzam, na rua, no metro, no autocarro, com alguém de muletas ou cadeira de rodas e lhes perguntam, sem mais nem menos, o que lhes aconteceu.
Pode não parecer, mas não é uma atitude inofensiva. Uma mulher que Ema entrevistou para um dos seus estudos disse-lhe de uma forma muito directa: “Não me levanto todos os dias a pensar que é uma tragédia estar numa cadeira de rodas. Ando numa cadeira de rodas todos os dias há 15 anos! Isso já não é um problema para mim.” O problema é outras pessoas olharem para ela daquela forma ou ela deparar-se com barreiras que a impedem de se deslocar. “Uma pessoa está confortável, a fazer a sua vida, e, de repente, é apanhada pelo modo trágico, fica presa nele.”
Uma coisa parece-lhe óbvia: “Ninguém se habitua a preconceito e discriminação.” Com maior ou menor resiliência, cada um vai aprendendo a lidar com aqueles olhares. Alguns sentem-se paralisar. Um “tetraplégico, de 20 e poucos anos, estudante do ensino superior, bem parecido, com um BMW, não consegue sair de casa por causa dos olhares.” Outros, com um corpo atrofiado, conseguem.
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Têm perdido força as associações. Julga-as sem “capacidade de diálogo com os políticos”. Não lhe parece que os pressionem. Talvez porque dependam dos apoios do Estado para sobreviver. Nos últimos anos, despontaram grupos nas redes sociais. Há, por exemplo, o (D) Eficientes Indignados, que alarga as preocupações a questões como a sexualidade, e o Lisboa (In) Acessível, que vai lançando petições, por exemplo, para o rebaixamento de passeios na capital.
Estes novos grupos parecem-lhe mais dispostos a adoptar estratégias de pressão. No ano passado, exemplifica, um tetraplégico fez greve de fome para que os grupos parlamentares se comprometessem a apresentar uma lei de promoção da autonomia pessoal. E a (D) Eficientes Indignados convocou uma manifestação.
Um milhão de pessoas vive com algum tipo de deficiência em Portugal. Por que só estavam “umas 20 pessoas” em frente à Assembleia da República na hora agendada pelos (D) Eficientes Indignados?
Ema encontra num instante um conjunto de razões para a fraca adesão a protestos de rua: “A maioria não consegue sair de casa, usar transportes públicos, depende da família para isso. Na maior parte das vezes, vivem em contextos familiares pobres. Não conseguem pagar o transporte para ir à manifestação. E também vivem muito isoladas. Não têm modelos positivos que as façam entender que o problema não está nelas, mas na sociedade, nas barreiras.”
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